O corpo é a mensagem
As diversas formas de representação corporal passam a ser, cada vez mais, o principal meio para manifestações artísticas e culturais
Por Caio Siqueira, João Reis e Paulo Neto
Nosso corpo opera como uma espécie de carruagem, que nos leva, nos trás e nos possibilita as ações no espaço físico. A cada passo da história, viemos aprendendo a como lidar com nosso corpo, como tratá-lo a fim de preservá-lo com saúde e como buscar a estética perfeita. Assim, o entendimento do homem com seu corpo vai evoluindo, até dado momento, onde se vê a atuação do corpo como objeto de manifestação, onde o indivíduo modifica o seu corpo com o objetivo de encontrar o seu espaço na sociedade atual. Pode-se julgar estranhas formas de manifestação artísticas no corpo do outro, mas é relevante entender o que move as pessoas de hoje em dia para fazerem modificações ou intervenções a partir de sua carne e osso.
Ao redor do mundo, temos diversas praticas que exaltam o corpo, fazendo-o parte de atuação de diferentes formas dentro do meio que vivemos. Pode-se elencar muitas maneiras em que nós, seres humanos, utilizamos, através do corpo, jeitos para nos comunicar, aprender, estimular, educar e também protestar. Atividades lúdicas e recreativas estão sendo levadas para dentro de salas de aula, fazendo-se aprender com o próprio corpo. Juliana Pithon, 22, é estudante de artes cênicas na Universidade Antropófaga. A instituição é organizada pela Associação Teatro Oficina UzynaUzona, companhia de teatro que existe desde 1958. A estudante conta que sempre teve vontade de fazer teatro, dança, mas acabou indo além: “Nós fazemos peças inspiradas em discursos de grandes pensadores, ideias que gostamos mesmo. Com a apresentação, temos a oportunidade de dizer, em outras palavras, aquilo que pensamos e sentimos”, conta com o brilho nos olhos de uma jovem que ainda quer ver seu mundo diferente. “Acho que as vezes nós, jovens, somos meio utópicos em relação as mudanças do mundo. Mas essas formas de diálogo educam e fazem pensar. Acho que é uma boa saída para que os jovens se interessem mais com assuntos políticos e até mesmo sociais”.
O corpo sempre teve uma representação muito forte no teatro. Lembra-se que, em tempos mais antigos, mesmo no teatro brasileiro, peças que continham personagens femininos ou erotizações, sem distinção de gênero, eram proibidos de se expor em frente ao público. Aos olhos da época pode parecer normal. Porém, ao passar dos séculos, várias formas de se representar através do corpo foram criadas.
SOCIAL
Mensagem
Leonardo Casanova tem 25 anos. É tatuador há três. Nascido em São Paulo, diz que já viu muita gente querendo desenhar muita coisa em seu corpo. Ele é um intermediador entre uma ideia e um símbolo, uma representação. “A tatuagem é uma forma muito bonita de manifestação artística”. Conhecedor da história da manifestação, ele nos conta que é uma arte milenar. Sim, ele está certo. Sabe-se dos primeiros registros, muito tempo atrás, que tribos indígenas e povos guerreiros já tinham a prática. “Sempre foi uma manifestação artística. São marcas específicas de intimidação, alusão a guerreiros, força física eatitudes mentais. Isso é traduzido no formato de arte corporal, mas foi criada como manifestações através de símbolos, representando capacidades dos humanos”, explica, como um ancião ou guerreiro de tempos remotos.
Na antiguidade encontramos as manifestações transmitidas com uma mensagem da capacidade pessoal do indivíduo. Muito tempo depois, no mundo contemporâneo, a ideia do corpo como manifestação ainda se manteve firme, porém com um caráter mais artístico. O prazer de representar movimentos artísticos e expandir a cultura das artes para as pessoas com o intuito de que a sociedade passe a valorizá-la.

Representa algo que a sociedade normal não conseguiu trazer. Às vezes você quer viver de arte, mas as pessoas não valorizam, a sociedade em si. É um estilo de vida, uma forma de pensar. Trazer algo bonito para quem está ao seu redor. Todos precisam de um pouco de arte
Leonardo Casanova
Como a manifestação corporal é uma forma de interpretação e exposição, diverge opiniões por parte da sociedade. Para muitos, o fato de as pessoas terem uma visão fechada a princípios fora de seu natural é quem causa repúdia e estranhamento. Outro fator seria o “medo do novo”, já enraizado em uma sociedade repleta de paradigmas.“A sociedade puritana em geral tem certa resistência ao diferente, ao que foge do padrão que cada um estipula para si. Furar sua própria pele, ferir,para fazer um desenho pode ser muito extremo para muitas pessoas, sempre foi. Como disse, transmitem força, mas também traduzem algo que choca as pessoas.”
Mesmo diante desse cenário conservador, a concepção das representações corporais vem se transformando. Em uma sociedade onde a mídia tem forte poder de influência e participação direta no cotidiano, os meios digitais têm contribuído para a alteração do grau de preconceito. Para o tatuador e bodypiercing Billy, de 25 anos, a discriminação não se encontra mais como nos anos passados. ”A aceitação é maior. A estética começou a ser valorizada. Apareceram artistas em televisão e isso ajudou a abrir a mente. A televisão e o crescimento do mercado ajudaram muito”.
As motivações para as pessoas fazerem modificações corporais podem ser as mais variadas quanto a nossa mente pode imaginar. Alguns por moda ou estética, outros por homenagem ou significado e outros para se sentirem integrados a determinados grupos. Leonardo conta que as pessoas vão ao seu estúdio pelos mais variados motivos. “Pessoas gostam de fazer homenagem a parentes, ou gostam da arte, que seja bonita e bem elaborada. As vezes não tem um significado, mas fazem porque acham bacana. Pessoas que querem tatuar e deixar marcado na pele coisas que tem a ver com o sentimento pessoal, coisas que a pessoa passou, que aconteceram na vida dela”. Todas essas transformações exprimem, mesmo que não seja essa a intenção de todos, uma mensagem, que pode ser interpretada de maneiras diferentes aos olhos de quem vê. Apesar dessas modificações serem populares entre os jovens, elas não se limitam a essa faixa etária, atualmente, é cada vez maior o número de pessoas que possuem uma idade relativamente avançada que procuram fazer modificações corporais, provando que a idade não é um limite para transmitir alguma mensagem através do corpo. “A faixa etária é de dezoito até quem sabe Deus”, brinca Leonardo, ele ainda completa: “Vem pessoas mais velhas também, que gostam da arte e levam a sério. Querem fechar o braço, fazer algo grande nas costas. Tem gente também que faz coisas minimalistas etc. Atendemos todo tipo de público”.



